28/05/2016

Grupos e Clubes do Livro no Facebook: o que aprendi.

Nota: Antes de começar a leitura real, compreenda que não estou generalizando (pois, não conheço e não participo de cem por cento dos grupos que existem na rede social virtual, mas, participo de vários e já participei de centenas, majoritariamente como convidado – por alguém de dentro). Então, estou falando sobre minhas próprias experiências e constatações de como a “vida literária” se desenrola nestes espaços. Não estou, também, levando para o lado pessoal no que diz respeito à repercussão de meus trabalhos literários compartilhados nestes grupos. Pois, apesar de muito, meus trabalhos sempre tiveram boa aceitação dentro destes espaços. Então, saiba que minha leitura quanto ao tema é imparcial, analisando apenas o plano geral do que existe (ou não) de movimento real dentro destes espaços. Sendo assim, boa leitura e bom entendimento.

Há muitos anos me deparei com inúmeros grupos criados no Facebook que possuíam a proposta de falar sobre livros, debater temas literários e incentivar a cultura literária por meio do incentivo à leitura, alguns deles propondo, inclusive, se dedicar e promover a literatura nacional, o consumo de publicações (entre outros formatos) de autores nacionais independentes. Propostas como estas já existiam em outras redes sociais – não é uma originalidade facebookana. Por trabalhar com literatura, publicações virtuais e físicas, militância literária, enfim, há mais praticamente quinze anos, fui “capturado” por grande parte destes grupos, que me convidavam e adicionavam (e continuam adicionando) às suas plataformas. Sempre com a proposta de incentivo à cultura literária e debate sobre literatura. Dentro de alguns dos quais eu fazia parte, realmente existia um cuidado para que o foco estivesse no debate e no consumo de produção de velhos e novos autores. Porém, na maioria, estes grupos se tornavam apenas um apanhado de gente quieta sem a menor vontade de falar sobre literatura. Um deserto de analfabetismo literário que passava meses sem um único sinal de vida, sem comentários, sem “curtidas”, sem nada. Pois bem, os anos se passaram e este deserto está cada vez maior, mais seco e menos fértil.

No entanto, existe um fenômeno neste cenário de grupos virtuais sobre literatura: cresceu absurda e desordenadamente o número de “escritores”. Uma quantidade enorme de gente escrevendo e compartilhando para... ninguém. Ninguém comenta, ninguém curte, ninguém lê. Escrevi a palavra escritores entre aspas, pois, é tanta gente – tanta gente mesmo – escrevendo e se achando o maior escritor ou escritora do mundo, que não damos conta de saber se são reais, se existe mesmo o livro, o conto, o que for. Existem imagens com frases e títulos (normal e fraudulentamente pegos e editados no grande poço da terra de ninguém que é a web), e compartilhados e curtidos por apenas a pessoa que se deu ao trabalho de fazer aquilo (o tal do escritor ou escritora). De centenas, às vezes milhares de pessoas em um grupo que se diz focado em literatura, ninguém presta atenção em nenhuma literatura (apenas o cidadão que teve a audácia de compartilhar seu texto neste ou naquele grupo).
Não sou lá o grande exemplo – não mesmo –, mas, duvido muito que todos estes “escritores” de Facebook, saibam o que estão fazendo. Duvido que tenham alguma especialização literária. E não estou falando de formação acadêmica. Estou falando sobre ter base literária, saber escrever, conhecer conteúdos, possuir uma bagagem literária que os incentive, influencie e os permita escrever e serem considerados escritores. Você não é escritor apenas por escrever seus pensamentos de um dia para o outro, e o quanto seu coração está partido pelo fato de você ter quinze anos e seu(ua) ex-namorado(a) tê-lo(a) tratado mal. Assim como ninguém se torna marceneiro da noite para o dia pelo simples fato de ter instalado uma prateleira (comprada) na cozinha. Mas, vamos deixar o “conteúdo” para ser debatido em outro momento (e haverá outro momento). Vamos voltar aos grupos.


Se não várias vezes, ao menos uma vez por semana eu retorno aos grupos dos quais participo e dou uma zapeada para ver o que está acontecendo, quais as novidades e tudo mais. Normalmente, só deserto. Às vezes um abismo também. Dezenas de postagens iguais em todos os grupos sem nenhum clique, sem nenhuma curtida, nenhum compartilhamento, nenhum comentário. Na semana seguinte, a mesma coisa. Tudo se repete. Postagens, zero clique, zero curtida, zero compartilhamento, zero comentário. Talvez, e esse talvez é real, os próprios membros e administradores destes grupos, e os próprios “escritores” ali não deem nenhum moral para tudo isso. Talvez não liguem, não se importem. “Um dia alguém vê, sei lá. Deixa aí. Vamos ver se vira alguma coisa”. E um mar de pessoas dentro de um grupo que não serve para nada. Não serve para quem escreve e não serve para quem lê. Pois, não há conteúdo real e não há interesse real (nesta ordem).

Os grupos que (ainda) fazem parecer que funcionam vivem lotados de editores e editoras nanicas, recém-nascidas, que buscam desesperadamente pela inocência de algum destes novos escritores para lhes oferecer uma “proposta” de negócio – que é muito simples: o tal do autor paga tudo do bolso e a “editora” ganha em todos os serviços subsequentes. E é claro que você já deve ter percebido, e se não percebeu, abra os olhos, a quantidade de promoções, sorteios, entre outras coisas, que fazem este ou aquele escritor, esta ou aquela editora. Só assim para prender a atenção. Não é o conteúdo. Não é o suor e a dedicação diária do escritor que chama a atenção. É o simples fato de estar se sorteando alguma coisa. Pois, todos nós queremos ganhar alguma coisa de graça, não é mesmo? Se tivermos a ilusão de estarmos ganhando algo, dane-se o quê, desde que eu ganhe. Posso não usar, posso não gostar, posso não dar a mínima, desde que eu ganhe. Nem que seja um simples marcador de página. Mas, eu quero. Mesmo assim, o deserto de analfabetismo literário continua. Perceba. Os cliques e a audiência estão todos concentrados nestas promoções. Não na literatura. Não no conteúdo. Nas promoções. Duvido muito que alguém esteja realmente preocupado com os livros e o que há dentro deles.

Existe também o ponto de vista que faço sobre a faixa etária deste pessoal todo que habita estes grupos de um modo fantasma. Muitos deles não estão preocupados com as histórias. Querem saber apenas se a protagonista (que é a tal ou o tal do escritor de quinze anos), sofreu, chorou, superou ou qualquer coisa sobre o ex-romance. Pois, normalmente, o que vemos é isso: uma torrente de conteúdo (falta dele) sobre sentimentos adolescentes absolutamente incompreendidos. E não é só isso. Você que é um pouco mais velho e/ou conhecedor básico de uma mísera parte da literatura, lembra-se bem de livros de romance do tipo “o capitão gostoso e fortão do barco” que acabou conhecendo a jovem imatura e mal compreendida pelo marido... e coisa e tal. Se lembra de histórias do tipo “O Primo Basílio”, “Lollyta”, entre outras. Mas, acredito que se lembre, inclusive, de que existia um conteúdo por trás de tudo isso, mesmo que muito leve e muito bem disfarçado. Existia algo ali, por trás de toda aquela novela. O que existe hoje, nestas milhares de historinhas de garotinhas e garotinhos mal compreendidos (por eles mesmos, por falta de conteúdo próprio), é apenas isso: histórias de garotinhas e garotinhos mal compreendidos. Que não sabem o que são, e muito menos sabem sobre o que escrever, sem base, sem fundamento, sem análise de conteúdo, sem a menor noção do que estão fazendo. Enfim, este é um conteúdo para uma próxima vez (e haverá uma próxima vez).
Tudo isso se reflete nestes grupos, que se tornam tão vazios quanto à própria literatura (chamem do que quiser) que tomam conta de suas postagens. Falta de conteúdo gera falta de conteúdo. E esse círculo gera falta de interesse de leitores que poderiam voltar sua atenção à leitura de conteúdos melhores (em todos os sentidos). Talvez, parte do “problema” seja dos próprios administradores destes grupos (que em sua maioria também não possuem bagagem literária, achando apenas bonitinho esse negócio de dizer que gosta de ler, e resolve abrir um grupo no Facebook para mostrar sua importância ao mundo); talvez, com o tempo, exista certo desencanto deste pessoal também, que acabam abandonando os grupos que eles mesmos criaram. Claro que dicas e conselhos fazem parte de outros tempos – quando as pessoas se preocupavam em ouvir e compreender –, mas, se fosse eu o administrador de grupos assim, faria uma limpa, daria uma vassourada em metade dos participantes e traria novamente o debate real e sério. Quem quisesse ficar, maravilha. Quem não quisesse, a função “sair” ou “excluir membro” está aí para isso.

Enfim, existe muita conversa para este assunto. Mas, como sei que já estou passando da segunda xícara de café e entrando no final da terceira página deste artigo/texto simples, e que raramente a metade das pessoas irão ler estas palavras (por falta de vontade), vou finalizando a ideia. Concluindo, salvar estes grupos não é apenas salvar a vaidade de quem os criou ou a respeitar a capacidade de escritores sérios, é salvar e respeitar também os leitores, ou os que podem se tornar leitores em busca de bons conteúdos. São centenas, milhares de pessoas somando-se grupos e grupos virtuais que poderiam ter suas mentes contempladas por conteúdos de qualidade, por debates de qualidade, por propostas que realmente proponham alguma coisa que lhes faça bem e lhes façam ter vontade de retornar ao grupo para debater, para ler, para acompanhar e, talvez, comentar na vida real com seus amigos reais.

No mais, sigo por aqui terminando de ler alguns livros e escrever alguns outros. 
Quem quiser, é só chamar.