Crônica Dezessete
Estávamos indo para a igreja um dia destes, meus pais e eu, e víamos muitas coisas horríveis acontecendo pelo caminho. Como eu era filha única, meus pais ficavam um de cada lado de mim na calçada, para me proteger eu acho.
Durante todo o percurso, que não levava mais de cinco minutos, nós víamos todos os tipos de aberrações possíveis: havia pessoas sorrindo, crianças brincando, casais enamorados; havia senhoras e senhores lembrando-se do seu tempo de juventude.
Que filme grotesco era aquele, isto sim é verdade! Eu não conseguia entender como as pessoas eram tão falsas daquele jeito. Como podem ser felizes assim se não estão a caminho da igreja?
Os padres sempre falavam sobre estas pessoas em seus sermões durante as missas brancas... Eram perfeitas aquelas palavras. Aquelas pessoas que vagavam de lá para cá, sem ter medo ou crença em nosso senhor... São ridículos, isto sim.
Não consigo acreditar, não consigo entender como deus deixa estas pessoas viverem desta maneira, tão medíocres, com falsos sentimentos. Mas ele sabe quem o ama de verdade, ele sabe bem! E todos serão julgados no final das contas; daí eu rirei muito, e muito mesmo.
Meus pais sempre me disseram para não confiar nestas pessoas sem deus. São os verdadeiros demônios na terra. Eles não acreditam em nada, a não ser a luxúria de suas vidas, e a falsa crença de que estão felizes, quando na realidade não estão. Pois a única e verdadeira felicidade está em deus.
Eu adoro a misericórdia, os pedidos de perdão. Eu na realidade não tenho certeza do motivo pelo qual peço tanto perdão para deus, mas acredito que algo de muito errado eu devo ter feito nesta minha vida, longos quinze anos de idade. Já devo ter nascido com algum tipo de pecado, que o próprio senhor implantara em mim, para que eu não me esqueça de seu poder de misericórdia. Eu adoro implorar por piedade... Adoro me martirizar o tempo todo.
O chamado dia do julgamento finalmente chegou, e as pessoas foram chamadas uma a uma para prestar contas com o todo poderoso. No entanto, este não estava disposto a diálogos. Fora imediatamente jogando todos no poço de lava de seu irmão cornudo. Ninguém sobreviveu. Alguns por que eram fiéis demais, outros por que eram fiéis de menos. Mas a verdade é que isto não fazia o menor sentido, e a humanidade já estava perdida de qualquer forma.
A menininha? Bom, ela fora a primeira a cair de mergulho no lago de fogo do imaginário religioso, pois questionava demais os fatos. Apesar de nunca ter negado a penetração do cajado de um padre ou outro em seu templo.
Este foi o Dia D. O dia em que a crença caiu desmistificada, e a realidade do nascer e morrer se tornou a nova religião.
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