10/05/2019

Quer ajudar o Brasil? Assuma-se como brasileiro.


De meados de 2018 para cá – atravessando as eleições presidenciais –, muita coisa se ouviu da boca de muita gente, e uma das palavras-chave mais forte que virou febre de verão no imaginário popular fora “patriotismo”, até, por vezes, com o discurso de “Brasil para os brasileiros”, lembrando os anos de 1930/45 e a posterior queda do Muro de Berlim, quando a reunificação das duas a Alemanhas trouxe à superfície o desemprego, a falta de trabalho e tantas outras problemáticas sociais da época (que gritavam “Alemanha para os alemães”, quando, neste momento, tentaram-se ressurgir movimentos neonazistas que se infiltravam em movimentos trabalhistas e sociais, sindicatos etc.).

O patriotismo, o amor à pátria, porém, não reflete exatamente a realidade de quem gritou e ainda grita alto o “patriotismo brasileiro” em campanha. Na verdade, esse amor à pátria dos brasileiros que gritam pelo patriotismo reflete, nada mais, que a segregação enraizada destes indivíduos (coletivos); “patriotismo” também gritado aos berros e agressões como “nacionalismo”. Nacionalismo este, um apreço incomensurável pela nação e por tudo aquilo o que é próprio de sua nação. Contudo, o brado pelo nacionalismo que foi marca registrada, e ainda é, na boca de alguns incompreendidos e incompreensíveis, também não reflete necessariamente o que é ser nacionalista.

Contraditoriamente, estes inúmeros “patriotas” defendem apenas o que eles mesmos acreditam como sendo sua pátria, totalmente diferente da realidade que os cercam, pois ignoram toda a diversidade a sua volta. E também vão na contramão do que seria o nacionalismo, pois insistem na diminuição do Estado na vida pública, além de torcerem o nariz para a produção nacional, seja ela em qualquer área. Patriotas e nacionalistas de butique que vão na onda de discursos lamentáveis e diminutos de qualquer conhecimento real e do bom senso; e uma butique que não vai muito além das paredes de suas casas.

Mas, a crítica aqui (se é que esta é uma crítica), não é apenas sobre eleitores e fetichistas segmentados, e sim, para todos nós que falamos de um Brasil enquanto Brasil, enquanto país de origem, enquanto território e morada. A ideia, então, versa, principalmente, sobre todos aqueles que defendem a ideia de um Brasil melhor.

É compreensível que todos nós queiramos um Brasil melhor. É compreensível que estes “todos nós” estejam divididos em inúmeros segmentos e camadas sociais. É compreensível, mesmo assim, mesmo com esta sociedade dividida, que cada um de nós desejemos um país melhor. E é compreensível que cada um de nós tenha uma compreensão, ou pelo menos uma ideia muito superficial do que seria este Brasil melhor. Pois, cada um de nós, individualmente, parte de nossas próprias convicções. Porém, coletivamente, o discurso não vai para o mesmo lado.

Politicamente, penso que se pode reverter a realidade retrógrada que se instalou fazendo uma coisa que, culturalmente ao que parece, não fazemos: sentir vergonha e assumir o erro. Do contrário, nunca haverá compreensão e aperfeiçoamento em nossa sociedade. Votou errado? Assuma e ajude a reverter a situação. De forma geral, cometeu um erro e sabe que fora um erro, e sabe que este erro gerou uma ação ou reação desagradável? Envergonhe-se e pronto; ajude a melhorar as coisas a partir daí. Ninguém se envergonha de mais nada, e não se pode refletir sobre nossos erros sem o mínimo de sentimento de vergonha; não a vergonha exposta, pública, de plateia. Não. Vergonha íntima, nossa, por nós mesmos para com nós mesmos.

Queremos continuar lutando por um Brasil melhor? Queremos falar de uma pátria, de uma nação? Então, temos que, obrigatoriamente enquanto povo, enquanto sociedade brasileira, compreender e aceitar que sim, existiu escravidão no Brasil e que todos nós, historicamente, somos responsáveis, não pelo ato da escravidão em si, mas pela compreensão que nos traz o fato histórico e pela responsabilidade que temos em minimizar os danos causados. Temos que assumir que existem sim inúmeras formas de preconceito no Brasil, contra todas as minorias, contra afrodescendentes, contra mulheres, contra LGBT+, contra índios, contra pobres, contra crianças, contra idosos. Temos que assumir que existem mais assassinatos por vários fatores no Brasil por ano do que em vários países do Oriente Médio que vivem sob tensão bélica e guerra civil. Temos que assumir que o desmatamento é sistematizado, e que estamos perdendo diariamente nossa flora e fauna em nome do lucro de grandes investidores. Temos que assumir que o desemprego é real, e os trabalhadores perdem seu lugar para o capital financeiro que nada produz. Temos que assumir e reconhecer a diversidade sexual, a diversidade cultural, a diversidade religiosa fazendo com que todas existam em harmonia. E temos que assumir toda essa realidade brasileira e nos envergonhar por isso. Só assim podemos lutar por um Brasil melhor, pois meu Brasil não é da porta de minha casa alugada pra dentro. Meu Brasil é o todo, todos os Estados, e deste Brasil fazem parte todos os brasileiros e residentes com todas as suas identidades e originalidades.

É de vital importância que nos assumamos enquanto brasileiros, e devemos nos apoiar na história de nosso país para isso, uma história que se mistura com as transformações do mundo numa realidade brasileira que insiste em nadar contra a maré, num esforço contínuo e teimoso de involução.



Prof. Marco Buzetto | 10 de maio de 2019
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